Economistas de renome ouvidos pela Comissão Temporária da Covid-19 foram unânimes ao apontar a vacinação e a pesquisa científica como primordiais para ajudar o país a superar a pandemia e seus desdobramentos
Acelerar a vacinação contra covid-19, retomar as aulas presenciais com segurança sanitária e garantir a realização de pesquisas para aprimorar e financiar projetos voltados à assistência, saúde e geração de emprego foram algumas das iniciativas apontadas por especialistas e senadores como necessárias para enfrentar o cenário pandêmico no país. Durante a audiência pública interativa da Comissão Temporária Covid-19, que ocorreu nesta última sexta-feira (11), parlamentares criticaram a ausência de um plano nacional que possa fazer frente às consequências da doença no Brasil e sinalizar o que será aplicado no pós pandemia.
Para o diretor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Social, Marcelo Neri, um dos grandes desafios é superar o aumento da desigualdade social, que segundo ele, ficou ainda mais evidente com a chegada do vírus. Neri destacou que enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) do país dá sinais de recuperação, há uma queda “muito pior” na base da distribuição de renda e na geração de emprego, principalmente para os jovens. Preocupado com o aumento da evasão escolar, ele defendeu como forma de superar esses desafios a aceleração da vacinação e o retorno das aulas presenciais.
— De um lado a gente está sacrificando a educação. A educação no Brasil era ruim, mas ela vinha melhorando. Tanto no nível dela quanto a desigualdade dela, e isso foi revertido na pandemia. Então o vento que soprava a favor está soprando contra. É um vendaval durante essa pandemia — afirmou.
A mesma opinião foi expressa pelo vice-presidente da comissão, senador Styvenson Valentim (Podemos-RN). De acordo com ele, é impossível recuperar o crescimento econômico, com geração de emprego e renda, sem oferecer condições de profissionalização aos jovens que, segundo ele, estão sem acesso à educação remota ou presencial.
— Que emprego seria esse para uma população que não vai para a escola? Que está com uma evasão altíssima? Que emprego é esse que a gente está falando? Numa sociedade tão tecnológica, tão evoluída. Que emprego é esse que as escolas não acompanham para profissionalizar nenhum tipo de adolescente que nem está na escola e nem está no trabalho, não está em canto nenhum — disse o senador.
Auxílio emergencial
Ricardo Paes de Barros, economista e coordenador do Instituto Ayrton Senna e professor do Insper, disse que o país precisa centrar esforços na realização de estudos e planejamentos capazes de identificar os que realmente mais precisam do auxílio emergencial e de um mecanismo que possibilite a inserção produtiva dessas famílias. Ele ainda defendeu a construção de um plano de desenvolvimento individual para esses brasileiros e também para as comunidades através da atuação dos agentes sociais e de um canal de comunicação sólido entre os governos federal, estadual, municipal, e a sociedade civil.
— Nós temos mais que 250 mil agentes sociais já alocados ao Cras (Centro de Referência em Assistência Social). Ou seja, nós temos a capilaridade, nós temos os agentes e, mais do que isso, nós temos um programa chamado Paif (Proteção e Atendimento Integral à Família), que é parte do nosso Sistema Único de Assistência Social, que tem a finalidade exatamente de dar esse atendimento individualizado — explicou Paes de Barros, que foi pesquisador do Ipea por mais de 30 anos e ajudou a formular políticas de combate à desigualdade social, como o Programa Bolsa Família.
Saúde pública
Na opinião do representante do Conselho Nacional de Saúde, André Luiz de Oliveira, a pandemia deixou ainda mais evidente o que chamou de desfinanciamento da saúde pública. Ele observou que, para garantir o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS), o governo teve de aprovar créditos extras ao orçamento indicando a falta de recursos na área. Ele manifestou preocupação com as demandas represadas que o sistema precisará dar conta após a pandemia.
— Nós temos que pensar no pós-pandemia e, no pós-pandemia, nós temos uma demanda reprimida que agora está agravada com a própria situação da pandemia. Há um cálculo em torno de um bilhão de procedimentos represados a mais do que nós já tínhamos na demanda reprimida antes, pré-pandemia. Então, com certeza, nós vamos precisar de muitos recursos para que possamos administrar melhor essa situação e avançar cada vez mais nesse acesso à saúde, que é garantia constitucional e da população brasileira — alertou.
Teto de gastos
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) criticou a ausência de um plano nacional com ações pensadas para o momento pós pandemia. Ela classificou o sistema público de saúde como subfinanciado e culpou a Emenda Constitucional 95 (teto de gastos) pela redução de recursos na área.
— Até agora nós não temos nem um plano para alavancar a economia e saúde do Brasil. Isso é o real. As únicas medidas adotadas são ajustes fiscais — que eu acho que a gente não tem mais nem condições de se mexer na cadeira de tão ajustados que estamos — e a venda do patrimônio nacional — afirmou.
O subsecretário de planejamento e orçamento do Ministério da Saúde, Arionaldo Bonfim Rosendo, reconheceu que, pelo menos a nível orçamentário, a pasta ainda não tem pensado em ações pós-covid. Segundo ele, o ministério tem se dedicado a concentrar esforços ainda nas iniciativas de enfrentamento da doença como a oferta de mais leitos de UTI, medicamentos e vacinas. No entanto, ele defendeu a adoção de medidas de curto, médio e longo prazo pela pasta como o fortalecimento do SUS, a atenção aos atendimentos e cirurgias represadas além dos sequelados da doença. Ele também identificou como ação importante a leitura da crise e identificação de acertos e erros cometidos que, segundo ele, deverão servir para construção de um plano preventivo para situações futuras.
— A principal ação que o Ministério da Saúde tem que desenvolver é fazer uma leitura do que aconteceu no país, em relação ao enfrentamento de uma pandemia, os erros que nós cometemos, construir formas de você, no futuro, se precaver com relação a possibilidade de ter uma contaminação tão alta no país e, inclusive, com o número de pessoas que procuram a rede pública tão grande com a ocupação quase que 100% dos leitos ofertados — declarou.
Requerimento
Os membros da comissão aprovaram ainda um requerimento (REQ 76/21) da senadora Kátia Abreu (PP-TO) para realizar audiência pública sobre o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas no segundo semestre deste ano. Para o debate, serão convidados os ministros da Educação, Milton Ribeiro, das Comunicações, Fábio Faria, além de um representante do Banco Mundial, que também deverão falar sobre o mapeamento da infraestrutura tecnológica e sanitária necessária para essa retomada.
Fonte: Agência Senado