O Ministério da Educação abre, nesta semana, uma consulta pública para ouvir entidades e especialistas sobre a autorização de cursos em Direito, Enfermagem, Odontologia e Psicologia à distância. A possibilidade acontece em meio à explosão de vagas EaD no país e enfrenta resistência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que cita a baixa taxa de aprovação nos exames para exercer a profissão, e dos conselhos federais envolvidos.
Ao mesmo tempo, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirma estar preocupado com a falta de qualidade nos cursos à distância. Segundo o último Censo da Educação Superior, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), houve um salto de 139,5% no número de vagas em cursos nessa modalidade nos últimos quatro anos, passando de 7,2 milhões em 2018 para 17,2 milhões no ano passado.
Ao apresentar os novos dados na última semana, Santana disse que o MEC irá rever as regras que legislam o ensino à distância no Brasil, no intuito de endurecer a fiscalização do funcionamento dos cursos.
— Nossa preocupação não é ter curso a distância, mas garantir a qualidade desse curso para a formação do profissional. Estávamos aguardando o relatório desse último Censo para tomar decisões mais rígidas para regular e coordenar esses cursos — declarou o ministro na ocasião.
Cabe à pasta autorizar ou barrar o ensino à distância nas redes pública e privada. Das 17,1 milhões de vagas, 17 milhões são em faculdades particulares, com oferta para licenciaturas, cursos tecnólogos e bacharelados. Pedagogia, administração e contabilidade são os três cursos a distância com mais matrículas.
Em junho, a OAB assinou uma nota conjunta com os Conselhos Federais de Enfermagem (Cofen), Psicologia (CFP) e Odontologia (CFO) com posição contrária à ampliação. Presidente da Comissão Nacional de Exame de Ordem da OAB, Marco Aurélio Choy coloca em questão a qualidade dos cursos jurídicos do país.
— O Brasil hoje é o país com o maior número de cursos jurídicos do mundo, proporcionalmente. São mais de 2 mil cursos. Ao mesmo tempo, temos um baixíssimo nível de aprovação no Exame de Ordem, com uma taxa de 22%, o que é um reflexo da má qualidade dos cursos — disse Choy.
Segundo o presidente, no último ciclo de avaliação da OAB, somente 193 cursos de 2.000 conseguiram o indicador mínimo de qualidade.
— Isso é menos de 10% dos cursos. Temos uma forte preocupação e acreditamos que a modalidade prejudica a formação prática dos cursos.
Já o CFP defende que todos os cursos da saúde sejam integralmente presenciais. “Não podemos formar psicólogos/as sem levar em conta os conhecimentos científicos da própria Psicologia, entre eles o de que habilidades básicas na área, como as de acolhimento e empatia, de comunicar-se de forma eficaz e apropriada em diferentes linguagens – visual, sonora, corporal -, entre outras, só se desenvolvem a partir das repercussões emocionais provocadas pela presença real do outro”, afirmou o órgão em nota pública na última semana.
O Cofen argumenta que as atividades de um enfermeiro “não podem ser desenvolvidas sem contato direto e intenso com pacientes e equipamentos de saúde”.
Para o sócio da Covac Sociedade de Advogados e especialista em direito educacional, José Roberto Covac, também existe um problema mercadológico entre as faculdades particulares:
— Os cursos à distância têm sido oferecidos por um preço muito menor que os presenciais. Há várias instituições, sobretudo pequenas, que estão ancoradas no curso de direito, numa mensalidade muito maior do que o que costuma ser cobrado no EaD. Dependendo de quantas vagas autorizadas, haveria um grande impacto nas instituições de médio e pequeno porte.
Dados do Inep mostram que o número de ingressantes em EaD superou o número de ingressantes nos cursos presenciais pela primeira vez em 2020. Em apenas um ano, entre 2021 e 2022, foram mais de 435 mil novos alunos. Enquanto isso, o número de vagas no ensino presencial caiu de 5,9 milhões para 5,6 milhões.
Fonte: O Globo