São preocupantes os dados do recém-divulgado estudo sobre casos de covid-19 nas escolas estaduais paulistas. Realizado pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu), coletivo de pesquisadores e docentes de universidades e escolas públicas, o levantamento questiona os números divulgados pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP), classificando-os como “irrealistas”. Haveria risco real para os professores. De acordo com a sondagem, a incidência de covid-19 entre educadores foi quase 3 vezes maior do que na população estadual de mesma faixa etária (25 a 59 anos). O governo trabalhava com a informação de que a proporção de casos confirmados nas escolas era 33 vezes menor do que a registrada em São Paulo. O levantamento da Repu traz uma diferença gritante — para pior.
Considerando uma amostra de 299 das cerca de 5 mil escolas da rede estadual, o trabalho mira diretamente o Boletim Epidemiológico da Educação. Divulgado no final de fevereiro pela Seduc-SP, o documento era tratado pelo governo Doria como a principal sustentação técnica para o retorno presencial. A alardeada incidência “33 vezes menor do que a do Estado” é demolida no novo estudo, que fala em “graves falhas metodológicas”. A mais clamorosa: utilizar na conta o total de estudantes matriculados, e não os que de fato foram à escola no período. No caso das redes estaduais, isso poderia implicar uma diminuição de 3,8 milhões de estudantes para apenas 600 mil, o que fatalmente inflaria os coeficientes de incidência de covid-19.
Também não houve separação dos casos de alunos dos de professores. Como estudantes são menos atingidos pelo coronavírus e representam 92% da população escolar, as ocorrências entre docentes e funcionários — que segundo dados da própria secretaria representam dois terços do total de infecções — ficam diluídas, dando “a falsa impressão de que professores e servidores se infectaram muito menos do que a população em geral”, como afirma a nota técnica.
O levantamento ainda defende que a taxa de crescimento de casos durante a chamada “segunda onda” também é maior do que se supunha. Entre 7 de fevereiro e 6 de março, período de volta às aulas, a disparada na incidência de covid-19 entre professores foi de 138%, ante uma alta de 81% na população de 25 a 59 anos.
A nota técnica também enumera críticas à falta de transparência sobre as adaptações dos espaços da rede para o novo normal pandêmico. Como exemplo, cita a anexação de 11 fotografias ao Tribunal de Justiça de São Paulo como comprovação da alteração das estruturas para receber os alunos. Argumentando que os dados não têm representatividade para as 5 mil unidades da rede, o documento afirma: “Não há como avaliar se o volume de recursos disponibilizado foi suficiente para garantir condições de segurança sanitária nas escolas estaduais.”
Vistos em conjunto, os números embasam a principal conclusão do estudo: “a retomada das atividades escolares presenciais não pode ser considerada segura nas escolas da rede estadual”.
Nem poderia ser diferente. Ao governo do estado cabe trazer esclarecimentos rigorosamente técnicos, confirmando ou refutando, no terreno da pesquisa científica de qualidade, as inquietantes descobertas do estudo da Repu.
Mas o levantamento não traz apenas más notícias. Em Osasco, um pequeno grupo de escolas com índices menores de contaminação adotou, por conta própria, medidas mais severas de proteção — como rodízio de profissionais, afastamento e testagem de pessoas que tiveram contato com caso suspeito e limitação de público inferior aos 35% estipulados pela Seduc-SP. Para os autores do estudo, a estratégia “parece ter contribuído para uma redução do número de casos de covid-19 entre professores”.
Ganham força pedidos de aceleração na vacinação de educadores e de revisão de protocolos no sentido de uma maior rigidez — reivindicações de movimentos de classe, sindicatos e associações de professores que a administração estadual trata como “intransigentes”. Com a palavra, o governo Doria.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
Fonte: Ecoa UOL