A busca pela excelência acadêmica vai muito além da infraestrutura e exige um compromisso efetivo com a formação de qualidade
Eu sempre ressalto que o fato de uma instituição de ensino superior ter estudantes engajados e professores titulados não garante nota máxima no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Currículos novos e metodologias de ensino modernas são inúteis se os professores não estiverem dispostos a mudar suas práticas pedagógicas e avaliá-las constantemente. A política de avaliação do ensino superior tem se tornado cada vez mais complexa, e isso representa um desafio para os gestores, especialmente os mais novos, que precisam lidar com uma regulação pública extensa e detalhada.
O Enade é um exame extremamente competitivo. Ele envolve cerca de 2.500 instituições de ensino superior (IES) participantes, mas apenas as 2% melhores conseguem atingir a nota máxima 5. Outras 16% aproximadamente terão conceito 4. Por isso, é essencial que os gestores das IES avaliem os indicadores de desempenho e compreendam a lógica competitiva do exame. É necessário realizar diagnósticos detalhados para entender como os estudantes podem melhorar seu desempenho e como a IES pode contribuir para a melhoria de qualidade na formação dos profissionais. Um dos pontos que devem ser considerados é a importância do Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD), que pode impactar significativamente os resultados no Enade.
Desde o início do atual governo, o Ministério da Educação (MEC) tem endurecido os critérios de avaliação. A nota do Enade passou a ser correlacionada com um padrão mínimo de desempenho, refletindo preocupação com a formação de profissionais capacitados para o mercado de trabalho. O exame tem priorizado situações-problema e casos de ensino, em detrimento de questões puramente conceituais. Além disso, o número de questões aumentou e a área de avaliação triplicou, o que exige ainda mais dos estudantes.
Ao longo dos últimos 10 anos, analisei o desempenho de cursos como administração, direito, psicologia, engenharias, saúde, licenciaturas e informática, e parece evidente que, apesar dos investimentos na estrutura das IES, a avaliação da aprendizagem não acompanhou essa evolução. As notas do Conceito Preliminar de Curso (CPC) estão sempre muito acima das notas do Enade e do IDD, o que indica que as instituições são mais eficientes na avaliação das condições de oferta do que na mensuração da aprendizagem dos alunos. Há um notório problema, que é a falta de formação adequada de professores e coordenadores em avaliação, e isso impacta diretamente os resultados.
Acredito que o debate sobre a gestão acadêmica precisa avançar para a gestão da aprendizagem. Infelizmente, temos dado pouca atenção para a testagem das metodologias de ensino-aprendizagem em situações que preparam os alunos para o exercício profissional. A avaliação deve identificar o que precisa ser melhorado no ensino, para as IES saberem se as eventuais fragilidades nesse processo foram superadas.
Sabemos que no Enade todos os tipos de IES, modalidades e cursos têm obtido poucos bons conceitos, o que explica a baixa produtividade do trabalho e a limitada capacidade de inovação dos milhares de alunos que se formam anualmente no ensino superior do país. Segundo os dados de aprendizagem do Enade, praticamente em todas as carreiras o percentual de acertos em perguntas que testam os saberes científicos dos estudantes não chega a 40%, e não passa de 20% nas questões que simulam situações reais de trabalho.
Ampliar a eficiência na avaliação significa treinar supervisores para mensurar o desempenho de alunos e formandos, conectando teoria e prática, e promovendo uma aprendizagem mais significativa e impactante, que gere transformações reais na formação acadêmica. Precisamos investir na capacitação docente e na implementação de estratégias pedagógicas mais eficazes. Compreender melhor os indicadores do Enade e o impacto do IDD pode ser a chave para melhorar o desempenho institucional.
A busca pela excelência acadêmica vai muito além da infraestrutura e exige um compromisso efetivo com a formação de qualidade. O ensino superior precisa investir mais em metodologias de avaliação da formação dos futuros profissionais de forma consistente e objetiva, para prepará-los a responder com eficácia problemas complexos, especialmente aqueles que fazem parte das situações reais de trabalho trazidas pela revolução digital.
O desafio está lançado. Cabe a nós, gestores e orientadores acadêmicos, enfrentá-lo com estratégias sólidas e uma visão de futuro.
Fonte: Correio Braziliense
Foto de capa: Reprodução/Freepik